18.12.13

Rua João Martins Branco

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1931 foi um ano de grande agitação política contra a Ditadura Nacional. No Porto assim como em Lisboa surge nos finais de Abril uma crise académica. Durante uma ocupação da Faculdade de Medicina há uma carga policial que fere gravemente três estudantes. Um deles, João Martins Branco, estudante do Instituto Industrial e Comercial do Porto, é sepultado no dia 30 de Abril. Uma multidão acompanha o funeral que atravessou o centro da cidade.

Encontra mais sobre o acontecimento e outros factos ocorridos bo mesmo ano no blogue de Irene Pimentel.



Sobre este arruamento:

Aqui existem prédios construídos pela Associação de Moradores de Massarelos o que motivou o alargamento de um antigo caminho que passava diante do edifício do antigo Colégio Alemão. Nos finais dos anos cinquenta o prédio serviu de anexo do Liceu Normal D. Manuel II, e, posteriormente, acolheu locais da Emissora Nacional.



Ainda sobre João Martins Branco:

« Um leitor enviou ao Director do JN uma carta contestando afirmação minha numa destas crónicas. Até aí, tudo bem. A manifestação da opinião dos que lêem os jornais é um acto saudável. Por mim, leio sempre a correspondência dos leitores tomando posição perante o que se passa no país e no Mundo, através de comentários não raro pertinentes e ajustados à realidade.
A deste leitor visava o meu texto de 30.3.2006, no qual escrevi "A [camélia] "Saudade Martins Branco" que agora soube ter sido dedicada - honra de uma cidade insubmissa - à memória do estudante João Martins Branco, assassinado pela polícia nos confrontos da véspera do 1.° de Maio de 1931." O correspondente considera isto "mais uma mentira, ou por desconhecimento ou por atribuir ao antigo regime as culpas de todas as mortes que ocorreram em época que se viveu em tranquilidade a não ser para aqueles que a não aceitavam."
Depois, para o Director do JN "esclarecer esse, daquilo que se passou ponho o assunto na verdade", explicava "Havia desacatos na rua e a estudantada, irrequieta como sempre, aproveitava (...) para ir para a rua manifestar-se. (...) nN Largo dos Leões, pejado de estudantes, os desacatos começaram e, com a Polícia a lutar com os mesmos, a dada altura os estudantes e povo fugiram para o edifício em obras onde ainda era a Escola Médica (...). Em tropel, subiu-se ao 1.° andar, onde as varandas não tinham ainda grades e então o Martins Branco, aluno do 2° ano de Medicina, caiu da varanda abaixo e faleceu. Não foi, pois, assassinado."
A carta informa, ainda, que o subscritor "andava no 5.° ano do Liceu no Colégio João de Deus com mais colegas já falecidos. E utilizávamos estes distúrbios para dar justificação à nossa maneira de ser."
Sem polemizar sobre o assunto, gostaria de dizer o seguinte quem escreve para o público deve fundamentar as opiniões, com base nos testemunhos directos ou fontes credíveis. Posso errar por omissão ou falta de informação, mas não por mentir deliberadamente. A minha visão do que sucedeu em 1931 baseia-se no depoimento de duas figuras da maior idoneidade que participaram nos acontecimentos. Uma é o mestre insigne, Professor Joaquim Bastos, que, nas suas memórias, escreveu: "Entre nós aumentava a oposição ao Estado Novo. Surgiu uma rebelião na Ilha da Madeira. O meio estudantil agitou-se. Vários estudantes foram presos. (...) Nas vésperas do 1.° de Maio, realizou-se, no 2.° andar da Fac. Medicina, uma Assembleia Geral de Alunos (...) presidida por Júlio Machado Vaz (...) quando soube dos acontecimentos, corri para a Faculdade. Informaram-me do sucedido. Inacreditável, insólito, abominável. Soube que, pouco depois de começar a reunião, o edifício da Faculdade fora cercado por forças militares armadas de metralhadoras e dois oficiais da PSP entraram na sala onde estavam os alunos pretendendo acabar com a Assembleia. Machado Vaz, com a sua firmeza habitual e depois de saber que os oficiais não estavam autorizados pelo Director a entrar na Faculdade, exigiu que se retirassem. (...) Passado pouco tempo, elementos da PSP e da GNR entraram abruptamente na sala e obrigaram os estudantes a sair, empurrando os primeiros para o corredor e depois para as escadas. A Faculdade estava em obras e simples pranchas de madeira, mal seguras, funcionavam como corrimões. Com a pressão da massa humana comprimida, a vedação soltou-se e os estudantes começaram a cair para o vão da escadaria, alguns mesmo do 2.° andar. Por sorte, havia um grande monte de areia no rés-do-chão, o que amorteceu as quedas e evitou uma desgraça maior.
A repugnante atitude das forças de repressão transformou-se em tragédia. Morreu um estudante e outros foram feridos, com maior dor e menor gravidade. A indignação foi geral. (...) A incrível actuação contra os estudantes recebeu uma condenação unânime."
O outro testemunho foi recolhido por Júlio Couto ("Monografia de Massarelos"), que entrevistou o cidadão e mestre exemplar Professor Júlio Machado Vaz. Disse "Mal a sessão teve início com cerca de 400 estudantes presentes, logo irrompe pela sala dentro, à paisana, e de chapéu na cabeça, o Major Mesquita, comandante da PSP, acompanhado pelo "Cabeça Torta" (alcunha do odiado Capitão Fernandes da mesma corporação). O Presidente da Assembleia mandou-o sair, sob monumental vaia dos estudantes, mas logo a seguir o segundo apresentou-se à frente de forte esquadrão de forças armadas, com elementos da PSP e da GNR, que varre o salão, obrigando os estudantes a sair pela porta das traseiras e daí para as escadas, ainda em obras (...) Só que cá em baixo estavam os agentes da Polícia de Informação (...) que iam prendendo os estudantes (...) Houve imediato recuo, confrontação de forças, e os estudantes foram sendo comprimidos contra os tabiques de madeira, que substituíam o inexistente corrimão, do que resultou para alguns uma queda de treze metros. Muitos ficaram feridos e três tiveram fracturas de crâneo, morrendo um deles."
As repercussões do caso provocaram verdadeira revolta nos portuenses, que transformariam o funeral na primeira grande manifestação do Porto contra a Ditadura "No dia seguinte era o pandemónio. A cidade estava toda de pé contra a morte brutal de Martins Branco e a violação da Universidade. (...)" O próprio autor da carta reconhece que 'O enterro ainda estava no Porto já a urna ia ao cimo da Av. da República de V.N. Gaia.'"
Estes são os factos. Para mim, apoiado nos testemunhos que muito respeito, a morte do estudante deveu-se à actuação "repugnante das forças da repressão". Para o correspondente, ele "caiu da varanda abaixo e faleceu".
A cada um sua verdade. Todavia, como na carta termina afirmando estar "cheio de referências mentirosas e caluniosas a períodos que a vida corria com mais tranquilidade, honestidade e honradez", diria apenas que a superioridade moral da democracia é que, nela , mesmo os que a atacam têm o direito de expressar as suas opiniões.
E não considero que um regime em que a GNR e a PSP invadiam a Universidade e empurravam jovens para a morte seja mais tranquilo, honesto e honrado do que a democracia. Mesmo uma deficiente como a nossa, é infinitamente superior à mais perfeita ditadura. Não existem, aliás, ditaduras perfeitas. Nenhuma sobreviveu para comprová-lo. »





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